Sunday, January 17, 2010

"O Amor em VISTA" (by Herberto Helder)


O Amor em Vista
(poema de Herberto Helder)

(...)
Dentro da tua face, estará a pedra da noite.
- Então cantarei a exaltante alegria da morte

Nem sempre me incendeia o acordar das ervas, e a estrela despenhada da sua orbita viva.
- Porém, tu sempre me incendeias.
Esqueço o arbusto impregnado de silencio diurno, a noite imagem pungente, com seu deus esmagado e ascendido.
- Porém, não te esquecem meus coraçoes de sal e brandura.
Entontece meu hálito com a sombra, tua boca penetra a minha voz, como a espada se perde no arco.
E quando gela a mãe em sua distância amarga, a lua estiola, a paisagem regressa ao ventre, o tempo se desfibra – invento para ti musica, a loucura e o mar.

Toco o peso da tua vida. A carne que fulge o sorriso, a inspiração.
E eu sei que cercaste os pensamentos com a mesa e a harpa.
Vou para ti com a beleza partida, os ombros violados, o sangue penetrado de paredes nuas.
Digo: eu sou a beleza, seu rosto e seu durar. Teus olhos transfiguram-se, tuas mãos descobrem a sombra da minha face.
Agarro tua cabeça àspera e luminosa, e digo: Ouves meu amor?, eu sou aquilo que se espera para as coisas, para o tempo – eu sou a beleza.
Inteira, tua vida o deseja. Para mim se erguem teus olhos de longe.
Tu propria me duras em minha velada beleza.

Então sento-me à tua mesa. Porque é de ti que me vem o fogo.
Não há gesto ou verdade, onde não dormissem tua sombra e loucura, não há vindima ou àgua, em que não estivesses pousando o silencio criador.
Digo: Olha, é o mar e a ilha dos mitos originais!
Tu das-me a tua mesa, descargas na vastidão da terra a carne transcendente. E em ti principiam o mar e o mundo.
(...)